É, no mínimo, curioso imaginar que a primeira bolha especulativa tenha surgido por causa de tulipas, uma flor silvestre que começou a ser cultivada no século X, na região da Pérsia, atual Irã.
Também conhecida como bolha financeira, esse ciclo econômico é caracterizado pelo rápido aumento dos preços de um ativo a ponto de ruptura, fazendo com que este “estoure” ou absorva em valor, após seguir sempre os derradeiros estágios: deslocamento, expansão, euforia, realização de lucros e queda.
Durante todas as fases de uma bolha, os investidores aumentam o preço de um ativo continuamente além de qualquer valor real ou sustentável. Quando a bolha “explode”, os preços desabam com a demanda, resultando, muitas vezes, na redução dos gastos das empresas e famílias, causando um potencial declínio na economia.
E tudo isso acontece quando os preços de mercado de um item sobem muito acima do valor real que vale. Um exemplo de mercado que vivem em uma bolha financeira é o de criptomoedas, energia solar e energia limpa.
Mas tudo isso começou com as flores.
A “mania das tulipas”
(Fonte: Stringfixer/Reprodução)
Ainda que não tenham nascido lá, quando as pessoas pensam em flores de tulipa, rapidamente imaginam os campos enormes localizados na Holanda. No entanto, isso só aconteceu porque um botânico chamado Carolus Clusius foi o responsável por importá-las para o Ocidente durante o século XVI.
Isso coincidiu bem com o momento da Era de Ouro holandesa, que se estendeu até o final do século XVII, quando o país se tornou uma das nações mais prósperas e avançadas da Europa.
As flores recém-chegadas na Europa Ocidental eram altamente valorizadas e, portanto, caras. E no início do século XVII, as pessoas ficaram ainda mais interessadas nas tulipas, criando a primeira bolha especulativa da história.
(Fonte: The Smithsonian Magazine/Reprodução)
O termo “mania das tulipas” foi cunhado pelo autor escocês Charles MacKay que, em seu livro Memoirs of Extraordinary Popular Delusions and Madness of Crowds (1841), detalhou como toda a bolha aconteceu, mas a partir de uma visão deturpada, causando confusão histórica até hoje.
Segundo MacKay, em 1636, as pessoas já experienciavam a febre especulativa, chegando a gastar um ano de salário em algum item na esperança de revendê-lo com lucro. Mas nada teria se comparado com o que a mania das tulipas causou na vida de nobres, cidadãos, fazendeiros, marinheiros, lacaios, criados e todos os tipos de pessoas que entraram para o negócio das tulipas.
Revendo a História
(Fonte: The Paris Review/Reprodução)
Sendo assim, a sociedade holandesa teria vivenciado esse período de frenesi pelas flores durante um ano e, quando a bolha financeira estourou, a economia quase foi destruída. Os pobres, que, aos poucos, se livravam da miséria devido ao bom negócio que faziam com a revenda das flores, foram lançados de volta à obscuridade de onde saíram na sociedade.
Já os mercadores, muitos dos quais representavam uma linhagem nobre, viram sua fortuna se esvair, terminando apenas com a casa que tinham. A falência provocou histórias perturbadoras de várias pessoas se afogando em canais, repercutindo ao longo dos séculos.
No entanto, segundo a historiadora Anne Goldgar, da Universidade King’s College, no Reino Unido, essa ideia toda perpetrada por MacKay e outros escritores prevaleceu apenas como uma maneira de zombar dos pobres que achavam que passariam para alta sociedade, e como alerta moral para os ricos muito ambiciosos.
Ao pesquisar na fonte dos arquivos históricos de várias cidades holandesas, principalmente em Haarlem, o centro do comércio de tulipas, Goldgar chegou à conclusão de que a depressão econômica sugerida por MacKay nem sequer existiu. Na verdade, a bolha especulativa não teria causado efeito real.
(Fonte: The Conversation/Reprodução)
O comércio das flores foi relativamente pequeno, de curta duração, e só surgiu devido ao luxo e supervalorização do que era exótico. Durante o período de riqueza e prosperidade holandesa no século XVII, devido à Companhia Holandesa das Índias Orientais, os mercadores, com dinheiro de sobra, apostaram em arte exótica para criar itens de colecionador da moda. As tulipas foram o alvo da vez.
Goldgar só conseguiu achar cerca de 350 pessoas que se envolveram no comércio, e nenhuma delas tinha relação com a classe pobre. A bolha se concentrou apenas em pequenas porções da alta sociedade.
As pessoas que perderam dinheiro quando a bolha estourou eram ricas o suficiente para que tulipas custando 5 mil florins não causassem grandes problemas em sua fortuna.
E ainda que não tenha nivelado a economia holandesa, a bolha arruinou reputações e relacionamentos, principalmente quando os compradores que prometeram pagar alto por uma tulipa se recusaram a comprar, causando um “choque cultural” em uma época em que o luxo nunca era negado por quem podia pagar.
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